8 de set. de 2010

Hitler no Brasil – Por Livia Leal

Imagem: Tijolo nazista feito na década de 40 no Brasil para colônia nazista.
Fonte:
http://avare.olx.com.br/itc/comment-about-tijolo-nazista-da-decada-de-40-feito-no-brasil-para-colonia-nazista-id-25547522-c-1

Se eu pudesse dar um título alternativo a este texto, certamente seria the ugly truth (a verdade feia, a verdade que dói).

Por trás da velha capa da moralidade, tenho percebido cada vez mais, entre uma conversa e outra, a presença do bigodinho que tanto alvoroço causou na Segunda Guerra Mundial. Sim, é dele mesmo que estou falando, do insano Hitler de ideias insanas e atitudes mais insanas ainda. A questão é: nossas atitudes e pensamentos têm mesmo levado em consideração que ideias tão perturbadoras são de fato perturbadoras? Tenho medo dessa resposta e tenho mais medo ainda quando se trata de quem vai dar a solução. Quanto a isso em particular, não tenho mais tantas dúvidas: Hitler está no Brasil. Quer ver?

Outro dia estava sentada ao lado de uma senhora no ônibus. Era uma senhorinha de serenidade estampada no rosto, inofensiva, daquelas que a gente ajuda a atravessar a rua ou cede a vez na fila do banco. Pensei em fazer alguma consideração sobre o tempo (aliás, o tempo no Rio de Janeiro tem ficado cada vez mais imprevisível), quando ela simplesmente soltou:

- Tá vendo aquela moça ali? – disse, apontando para uma mulher de rua grávida que passava – Tem mais é que castrar mesmo!

Não soube o que dizer. Acho que Heil, Hitler seria uma consideração adequada, mas a pobre velhinha poderia não entender a ironia e acabar sentindo-se ofendida. Pensei em explicar a ela que esterilizar seria o termo técnico correto, que castrar era utilizado para animais, mas cheguei a conclusão de que era mesmo essa sua intenção: tirar a humanidade daquelas pessoas. Como se ela pudesse tamanho disparate! E como se coubesse a ela decidir quem pode ter filho e quando pode ter filho.

Quanto aos direitos humanos, é melhor nem começar a falar, porque corro o risco de ser acusada de cúmplice de bandido ou algo como “louca utópica”. Direitos humanos viraram tabu, e quem ousa defendê-los merece ter seu pai seqüestrado ou sua filha atingida por um assaltante, pra ver o que é bom pra tosse.

E as favelas? Aaahhh... Joga logo uma bomba que tudo está resolvido, e o Rio de Janeiro vai ter paz novamente! Rezo a Deus todos os dias para que não surja um sujeito achando que isso é o certo, porque aprovação popular é o que não vai faltar. E sinto calafrios em pensar que é possível um novo Hitler, um Hitler que está escondido em muitos coraçõezinhos amedrontados e encolhidos, esperando apenas um Capitão Nascimento real, capaz de botar ordem nessa bagunça toda.

O que estão fazendo de nós? Em que estamos nos transformando? Olhamos com pavor o Holocausto, mas mantemos a mesma mentalidade mesquinha e fascista de outrora. Como se a vida humana pudesse ser definida por uma ação de um louco qualquer, que julga estar fazendo o melhor para todos quando simplesmente esconde assassinatos em massa, sob um pretexto muito maior que qualquer nível de compreensão.

Não sei. Também me sinto confusa quando observo a guerra civil que tem ocorrido lá fora, além da minha janela. Penso em inúmeras soluções, mas nenhuma parece boa o bastante ou suficiente para efetivamente melhorar a situação.

Mas estou certa de uma coisa: Hitler está no Brasil. Entre as alternativas dadas, entre as medidas que tem sido tomadas, entre pensamentos de cidadãos comuns de boa índole, entre as conversas de cada dia no ônibus, na escola, na sala, na esquina, Hitler está lá, com seu bigodinho de sempre, disfarçado de boas intenções, de soluções possíveis, de senso comum. E ainda me dá muitos calafrios perceber essa presença.

Um comentário:

Diego Rogério Goetten disse...

Parabéns Livia! De fato continuamos pensando somente em nós mesmos, como que padronizando as pessoas, tentando achar soluções iguais para pessoas diferentes. Pessoas que não conseguem se socializar são fruto deste tipo de discriminação autoritária, que acredita haver pessoas melhores e piores. Você disse tudo. Continue. Bjo.